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UMA LEITURA INSOLENTE DO VIDEOCLIPE QUE BLOCO É ESSE ILÊ AIYÊ
Deivison Moacir Cezar de Campos

Última alteração: 10-09-2017

Resumo


O presente estudo propõe uma leitura insolente do videoclipe Que bloco é esse? Ilê Aiyê, lançado em 2012. O vídeo, com direção de Ricardo Spencer e produção musical de Daniel Ganjaman e Duani, foi realizado dentro de um projeto que buscava maior retorno institucional para Petrobrás e mais visibilidade aos blocos afro tradicionais do carnaval baiano. Para isso, projetaram encontros entre músicos reconhecidos pelo público jovem para um encontro entre “dois mundos” (TOURINHO, 2013). O cantor escolhido para o videoclipe do Ilê Aiyê foi o rapper Criolo.

Na narrativa, o rapper caminha num trajeto recriado no vídeo pelas ruas do bairro da Liberdade até o Curuzu, onde fica a sede do bloco; ou seja, conduz os espectadores do Centro Histórico de Salvador até o terreiro de Ilê. Segundo os produtores, o que acontece depois da chegada foi todo gravado em sequência, sem ensaio e sem que Criolo soubesse o que iria acontece (TOURINHO, 2013). O videoclipe aponta para a descoberta do bloco, no entanto, numa leitura a partir do duplo, articulador da leitura insolente (CAMPOS, 2016), propõe-se que a caminhada do rapper o leva a um território simbólico afro-brasileiro no qual, após um ritual político-religioso, descobre-se negro.

A música do videoclipe sobrepõe versos escritos por Criolo aos da música da saída do Ilê Aiyê em 1975, que dá nome ao projeto, Que bloco é esse?, unindo os versos “Somo criolo doido e somo bem legal” com “Eu so fio de preto”. A presentificação da música, assim como a caminhada ao território simbólico do Ilê Aiyê, sobrepõe o duplo experiência e tradição (CASTINIANO, 2010), produzindo um aqui-agora complexo que oferece elementos de identidade.  O tempo da experiência contém vivências e memória, o Ilê, a casa. O tempo da tradição é o da ancestralidade e do imemorial, o Aiyê, o lugar dos Orixás.

O ritmo, cuja matriz é marcada por um “mesmo mutante” (GILROY, 2007)[1], apresenta-se então como o dinamizador desses processos temporais, da vida e, em última análise, aponta para dimensões de presença, pois é acionado e aciona o corpo negro, que é “um universo e uma singularidade: é a unidade mínima possível para qualquer aprendizagem. É a unidade máxima para qualquer experiência” (OLIVEIRA, 2004, p.11). No videoclipe, não é Criolo que apresenta o Ilê Aiyê e sim o rapper quem descobre pela experiência de presença “o mundo negro que viemos mostrar pra você.” A estratégia de branded content torna-se, numa leitura insolente, uma metáfora do desafio e da caminhada de tornar-se negro.


[1] “o mesmo é retido sem precisar ser reificado. Ele é permanentemente reprocessado. Ele é mantido e modificado naquilo que se torna decididamente uma tradição não tradicional, pois não se trata de uma tradição como uma repetição fechada ou simples. Sempre promíscua, a diáspora e a política de comemoração definida por ela nos desafiam a apreender formas mutáveis que podem redefinir a ideia de cultura através de uma reconciliação com o movimento com a variação complexa e dinâmica” (GILROY, 2007, p.159).


Palavras-chave


negro; videoclipe; Ilê Aiyê; insolência

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